quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Dialética da carne

"Aflição de ser água em meio à terra
E ter a face conturbada e móvel.
E a um só tempo múltipla e imóvel"

.Hilda Hilst.





Ato 1



Passo os dias te buscando em entrelinhas
Tentando te alcançar na poeira dos teus passos
Lentos e pesados
 que me mantém presa a ti se te afastas
Quando doemos um ao outro
Entre espinhos do jardim que nós mesmos cultivamos



Ato 2



Me acendes em luzes de neon
E fogos de artíficio
Com tuas mãos em brasas,
Me dominas em tuas garras
 Onde me deixo lânguida
Na entrega urgente de uma fome que não passa
De uma sede que não se sacia aos goles
Em pequenas mortes
Prelúdios da eternidade em frações de segundos.





quinta-feira, 18 de junho de 2015

Grotesque - O anticristo da fotografia

"There is nothing new except what is forgotten."
 
.Mademoiselle Bertin.


 
William Mortensen- Taken In West of Zanzibar , 1928

 William Mortensen  (1897 - 1965) foi um dos mais conceituados fotógrafos americanos durante a década de 30. Todavia, seus temas voltados para o selvagem, grotesto e erótico, somados as suas técnicas que envolviam colagem, ilustração e manipulação de negativos o fizeram por fim cair no esquecimento histórico. 

Com a chegada da modernidade a fotografia passa a assumir um caráter mais purista com o surgimento de lentes mais rápidas e precisas e todo um aparato tecnológico, distanciando-se, propositalmente, das demais artes plásticas. Por sua orientação pictorialista, William passou de conceituado fotógrafo a inimigo número um, sendo apelidado pelo principal defensor do purismo, Ansel Adams, de anticristo. Mas para William o fotógrafo deveria buscar harmonizar conhecimentos técnicos e criatividade artística, o que em sua opinião, poucos de sua época conseguiram.

Profundamente interessado em temas reprimidos pela sociedade de sua época, buscava através da exibição de imagens-conceito ativar aspectos arquetípicos inconscientes nos observadores, principalmente em relação a temas tabu, como tortura, corpos dilacerados, morte, sexo e agressividade. 


 
William Mortensen, The Heretic

 
William Mortensen, The Vampire 
"...some have suggested that the fear of death is the basic motive of all art, driving men to to try to immortalize a little of themselves in material more enduring then the flesh..." -- Mortensen


 
William Mortensen, Death of Hypatia


 
William Mortensen, Nude with Peacock


 
William Mortensen, Preparation for the Sabbot 
"Herein lies the reason for the equivocal effect of grotesque art on many people: the material is unfamiliar, and, by ordinary standards, unpleasant: yet it calls forth a deep instinctive response. Thus they are torn between repulsion and attraction..." -- Mortensen

 
William Mortensen -Obsession, 1930

William Mortensen- Taken In West of Zanzibar , 1928


William Mortensen - Salomé


William Mortensen - Nude with Demon



terça-feira, 9 de junho de 2015

Silêncio

 "As sereias entretanto têm uma arma ainda mais terrível que o canto: o seu silêncio.

.Franz Kafka.










Eu, sereia mitológica de tempos imemoriais
De mares bravios e reais
A mim coube, por destino ou escolha
Desbravar as profundezas, recôndidos e abismos
Solitária, desgarrada do bando
Voltei-me contra os deuses e seus desmandos
Neguei a efemeridade do canto-armadilha
E quis minhas escamas quentes e macias


Eu, sereia arquetípica anacrônica
Me alimento da verdade velada
Não da frivolidade amarga
De uma trova qualquer, em um porto ou outro encenada
Minhas águas são sempre agitadas
E não me interessa o encantamento que mente
Prefiro a negação do descrente
Que não se deixa enganar


Eu, sereia anárquica encarnada
Meus domínios são os mares do inconsciente
Para onde te levo enquanto te chamo, te atraio   
Mergulho no escuro do desconhecido
Busco um tesouro escondido
Que nunca foi encontrado

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

O Feminino em arquétipos e cores

“Com muito prazer teria incendiado igrejas e destruído caixas postais, embarcando numa onda de violência para defender os princípios da liberdade política, se não tivesse pavor à ideia de ser presa, de greves de fome... Apesar de gostar do papel de mártir, não tive coragem suficiente para exercê-lo"

.Madame Yevonde (in Câmera. The Women’s Book Club. 1940, p.37). 

 

Auto-retrato


Yevonde Cumbers Middleton (1893-1975) nasceu na Inglaterra e tornou-se conhecida como Madame Yevond. Filha de um fabricante de tintas de impressão, foi criada e incentivada pela família a ser uma mulher independente e, diferente de suas contemporâneas, acreditava que as mulheres podiam ter outras escolhas além de ter que se casar com um marido apropriado.

Seu engajamento na luta pela emancipação feminina como um todo e sua atuação nos movimentos sufragistas influenciaram profundamente a obra dessa fotógrafa que fez de sua carreira uma bela e desbravadora jornada através da sexualidade feminina e seu papel na sociedade.

Naquela época, mais especificamente anos 30, a fotografia em cores já existia mas era ainda um processo trabalhoso e considerado vulgar pelos fotógrafos de arte, sendo utilizada apenas na publicidade. Mas ela não era uma conformista e foi mais longe. Utilizando-se do processo Vivex e de filtros, suas fotografias apresentam cores saturadas com um toque surrealista. 

Em sua exploração do feminino, constantemente ela traz imagens arquetípicas, identificando influências históricas que possuem atributos como coragem, força, segurança, fragilidade a fim de dialogar com a mulher moderna e repensar seu lugar social.

A série As Deusas apresenta 23 modelos personificando as várias possibilidades do feminino. Ah, se a sociedade e os homens dessem mais valor a mulheres admiráveis o feminino seria muito mais sublime!!!